Casas Demolidas – Rua Gonçalo da Cunha

A loucura feroz e voraz da especulação imobiliária em São Paulo há muito tempo ultrapassou o limite do suportável. Se antes tínhamos que nos preocupar com uma ou outra casa demolida em uma rua, agora temos uma preocupação muito maior.

As demolições estão atingindo muitas vezes dezenas de casas, chegando até as ruas mais próximas. Foi o que aconteceu na sinuosa rua Gonçalo da Cunha, no bairro da Saúde.

Crédito: Google Street View

Engana-se o leitor se imaginar que apenas estas três casas da fotografia acima foram demolidas nesta rua. Para apresentar tudo que foi abaixo por ali, para dar espaço a dois novos empreendimentos, foi necessário montar a galeria que está no final do artigo. Ao todo foram demolidos 14 imóveis, entre casas térreas, sobrados e pontos comerciais.

Entre elas, sem dúvida, muitas residências sem qualquer valor histórico, urbanístico ou mesmo alguma beleza que motivasse a preservação, mas também algumas que eram belas e até mereciam sobreviver, como as três vizinhas da imagem inicial.

O mais bizarro desta demolição e deste novo empreendimento é o fato da construtora dizer que ali é Vila Mariana. Para empurrar imóveis cada vez mais caros, as empresas “esticam” os bairros mais vendáveis. Por isso, em alguns anos a Vila Mariana irá chegar em Parelheiros e o Jardim Anália Franco, na zona leste, em breve estará chegando até Itaquera. Não há qualquer coibição deste abuso por parte da Prefeitura de São Paulo.

Eram residências paulistanas típicas, térreas com quintal amplo, muros e portões baixos e de traços simples, mas muito agradáveis. Aos poucos (ou aos muitos) a Cidade de São Paulo vai perdendo suas casas de bairros, perdendo sua identidade. As pessoas vão perdendo o contato com a vizinhança, com os problemas e com as delícias de seus ruas, cada vez mais isoladas na miséria social que é residir em apartamentos cada vez mais altos, cercados em muros que parecem de presídios e alheios ao que acontece ao redor.

Antes ficávamos preocupados se nosso vizinho da última casa da rua não aparece na calçada por alguns dias “Não vi fulano esta semana! Será que fulano está bem ? “. Hoje, moramos em prédios com dezenas de condôminos e muitas vezes sequer sabemos o nome daquele que mora no apartamento ao lado.

São Paulo nunca teve tanta gente e nós nunca estivemos tão sozinhos.

Veja fotos dos demais imóveis demolidos Rua Gonçalo da Cunha (clique na miniatura para ampliar):

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8 respostas

  1. Onde eu morava na Parada Inglesa, tentaram por no chão de uma só vez na Rua Dona Gabriela , 1 chácara de 1000 mts², e mais 5 imoveis, com um total de 4000 mts², só não conseguiram por irregularidades nas documentações dos imóveis, por essas e por outras me mudei para Atibaia interior de São Paulo.

  2. Além destas casas, ainda há a possibilidade das outras que sobraram, já que a negociação perdura. Também tem a rua Dr. Francisco José Longo, que perdeu a mesma quantidade de metros em demolições. Nesta última, passei a maior parte da infância e fiquei chocado quando vi a minha infância ser demolida.

  3. EU VI O PANFLETO DESSE LANÇAMENTO. é hilário eles colocarem que fica perto de áreas verdes sendo que na fotro aérea só se vê cimento !!!

  4. Absurdo mesmo, mas o melhor é o que voce disse, a “esticada” do bairro. Aí já é aquela baixada da Saúde, e eles adoram inventar nomes do tipo: “Altos da Vila Mariana”, kakakakakaka. Péssimo, heim construtora, péssimo…

    1. Wilson,

      A política do site não permite a divulgação de links de construtoras e incorporadoras. Já sabíamos do link, mas optamos por não divulgar.
      Espero que compreenda. Abraços!

  5. Douglas Nascimento, antes de mais nada congratulações pelo magnífico trabalho de registro historiográfico da arquitetura urbanística de nossa cidade. Sempre que posso, gosto de visitar este espaço teu, para me embevecer das lembranças de minha cidade que trago na memória. Hoje, especialmente, uma emoção maior, ao deparar com esta página, que registra a demolição das casas de meus vizinhos por mais de 34 anos. Moro na Rua Dr. Francisco José Longo, desde 1981, e, venho resistindo a investida das construtoras em querer comprar a casa que comprei a duras penas, por financiamento da CEF em 25 anos (quitada com os recursos de meu FGTS de uma vida inteira de trabalho aos 12 anos do financiamento), onde iniciei a formação de minha família, criei filhos e netas, perdi o marido, e, a ganância de construtoras, querem por toda a força de achaques exterminar toda a minha história de vida. Não há preço que pague o meu direito de querer viver o final de meus dias em minha casa, que para mim, não tem valor de mercado mas afetivo e emocional. A demolição destas casas que você fotografou, para a construção do “cortiço vertical” (prédios), fez despencar até a rua, que por meses se manteve bloqueada, impedindo-me de entrar ou sair de minha própria casa, pois a cratera se abriu bem em frente a ela. A ganância do lucro imobiliário, como sói acontecer, em detrimento da qualidade de vida do munícipe, já vem trazendo mazelas de toda a ordem (que os administradores públicos e construtores chamam de valorização do bairro), com o paliteiro de prédios em profusão, espetados na Chácara Inglesa (Saúde), mormente nas ruas : Gonçalo da Cunha, Correa de Lemos, Francisco José Longo, onde, … pasme … li em reportagem paga que o “boom imobiliário” se dava em uma região de cortiços (o que não é verdade), pois a maioria dos moradores era constituída de profissionais liberais (advogados, engenheiros, médicos) e técnicos (enfermeiros, mecânicos, marceneiros), mas que se deixaram seduzir pelas ofertas em dinheiro feitas pelas incorporadoras e construtoras. Quais as mazelas ? De toda ordem, como por exemplo :
    a-) aumento do fluxo de trânsito, barulho e poluição:
    b-) queda constante de energia elétrica pela troca de dezenas de moradias por milhares delas empilhadas, gerando aumento de consumo;
    c-) queda recorrente de fornecimento de água, em distribuição não compatível ao aumento populacional;
    d-) aumento dos casos de crimes cometidos (assaltos, roubos, furtos, latrocínios) com bandidos atraídos pela alta capacidade econômica dos moradores do bairro, compradores das unidades ofertadas pelo preço na casa dos milhões de reais;
    e-) queda na qualidade de vida em razão de não se poder mais viver pacificamente, com os nem sempre educados moradores destes luxuosos prédios, pois dinheiro no banco não traz consigo o condão da boa educação,
    f-) desrespeito ao uso do espaço público, com cachorrinhos aos milhares defecando na frente dos portões dos moradores resistentes a se mudarem para outro bairro, longínquo de suas raízes, sem o bom senso do recolhimento dos excrementos;
    g-) a perda da paz dentro do próprio lar … o prédio construído na Correa de Lemos, que pela tortuosidade da via pública, dá para os fundos de minha casa, é habitado por crianças deseducadas que atiram pedras em meu cachorro e coelho que vivem em meu jardim de fundos (mataram meu coelho a pedradas), mulheres e crianças empoleirados nas grades do prédio, no local da piscina olhando para minha casa tirando minha privacidade ( e de minhas netas) em meu próprio quintal, dizendo impropérios e frases do tipo :”se não quer que olhe mande cobrir seu quintal” … e uma série de outras barbaridades, que me levaram a enfartar, veja você a gravidade do que se transformou um bairro residencial antes pacato.
    h-) as ruas são estreitas e o solo não comporta o peso de construção de tantos prédios, por ali corria um rio que fora canalizado, mas, exatamente na esquina de onde tirou estas fotos, ficava antigamente um pântano que foi aterrado, coisa que os compradores dos caros apartamentos nunca irão saber, e, não é improvável que, futuramente, aja algum desabamento pelo peso do edifício, como numa possível tragédia anunciada, mas que, até que ocorra, quiçá com vitimas, os administradores públicos e políticos que aprovam estes empreendimentos pensando apenas nos lucros (das construtoras e da prefeitura com aumento de arrecadação de IPTU) estarão bem longe do local e de seus postos por ocasião destas absurdas aprovações de ocupação do solo, sem um estudo eficiente e responsável de urbanismo e qualidade de vida.
    ….. Haveria outros aspectos negativos a elencar, mas, deixo de fazer, por desgaste emocional pessoal a evitar, pois que há quatro anos lido com este fator estressante. Só para terminar, o preço que pagam pelos imóveis, não dá para continuar morando no bairro. É o poder econômico vencendo a qualidade de vida humana!!

    PARABÉNS!! Pelo teu brilhante artigo. Sinto-me, com ele, acompanhada, solidariamente em minha indignação!!

    Saudações de *Yara Maria*

  6. Li todo o comentário de Yara Maria, e só tenho a lamentar. Fico muito triste pelos seus animaizinhos, o jeito é colocar telas para evitar as pedradas dos nefastos garotos sem educação. A Rua Assungui, no seu início, e o final da Rua Santa Cruz (ambas no mesmo quarteirão), bem como outros trechos desta última também tem sofrido o mesmo problema: construtoras compram um lote de casas ou estabelecimentos comerciais, e os colocam abaixo, para construir edifícios no lugar (um deles é um prédio de “estúdios” minúsculos, antigamente chamados de quitinetes). Infelizmente, nada podemos fazer a respeito. Eu me mudei da região em 2008, já bastante triste com o que estava acontecendo: a demolição de antigas casas que deram lugar a prédios modernos. Muito triste constatar que o Brasil é um país sem memória e sem apreço pela tradição arquitetônica, e com muitas pessoas sem educação e humanidade.

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