A herança italiana em São Paulo – como ela vive até hoje

Na foto, o antigo Cotonifício Crespi (clique para ampliar)

São Paulo é considerada pela maioria dos brasileiros e estrangeiros como a maior e mais receptiva cidade da América do Sul. Pela sua diversidade, aceitação de diversas culturas outrora imigrantes e sua pluralidade, é uma das cidades candidatas, dentro dos próximos dez anos, a se tornar referência mundial como cidade-global. Com 463 anos desde sua fundação em 1554, São Paulo não é só o principal motor econômico do Brasil: é também ponto focal para negócios, eventos culturais, acontecimentos esportivos de todas as magnitudes, seja a partida de abertura da Copa de 2014, seja em outros eventos esportivos de renome mundial.

Não à toa, a história de São Paulo está intrinsecamente conectada com a chegada de imigrantes e suas influências. Não precisamos ir longe; o bairro da Liberdade é um monumento a céu aberto às culturas asiáticas, em especial a japonesa. Da mesma forma, a influência italiana na cidade é inegável. A primeira onda de imigração do país europeu no Brasil se deu no final do século XIX, seguindo medidas de estímulo à imigração de forma a atrair mão-de-obra para a agricultura nacional.

Embora a imigração italiana tenha se iniciado na região Sul do país, a maioria dos italianos se assentou na região sudeste. A concentração de plantios de café na região de São Paulo fez com que os egressos da Itália ficassem em maioria no estado. Até 1920, 70% dos imigrantes italianos no país tinham se instalado em São Paulo. Em 2013, cerca de 34% da população do estado eram ou italianos ou descendentes.

Naturalmente, a presença de italianos trouxe diversos hábitos que se tornaram tão intrínsecos à cultura brasileira que sequer consideramos que nem sempre foi assim. O uso do “tchau” (ciao), hábitos culinários, como spaghetti e panetone no Natal, são breves contribuições.

Em São Paulo, os imigrantes italianos tiveram um impacto geográfico maior. Os bairros do Bexiga, da Mooca e do Brás se tornaram sinônimos da herança italiana. No caso da Mooca, o bairro conta com o Museu da Imigração, inaugurado na década de 90 e re-aberto em 2014 após extensa restauração. O local era anteriormente a Hospedaria dos Imigrantes, fundada em 1887, uma construção feita para os cafeicultores no século XIX tinha como objetivo inserir os imigrantes na província de São Paulo e direcioná-los para as lavouras. Apesar de estar dentro de um bairro predominantemente italiano, o Museu da Imigração presta homenagens às mais de 70 nacionalidades que ajudaram a moldar São Paulo como conhecemos hoje.

Museu da Imigiração (clique na foto para ampliar)

A Mooca é casa também do tradicional time de futebol Juventus. Fundado por operários em 1924 como Cotonifício Rodolfo Crespi Futebol Clube – em alusão ao Cotonifício Rodolfo Crespi, um dos principais locais onde os oriundi, os oriundos da Itália, procuravam trabalho na confecção de tecidos, tinturaria e malharia. A fábrica nunca fechava, e se tornou uma das primeiras construções de São Paulo a receber energia elétrica.

Em 1930, a diretoria do clube da Mooca mudou o nome da equipe para Clube Atlético Juventus, em homenagem ao time italiano de Turim. De acordo com o italiano Andrea Ruggeri à época, “para nós da comunidade italiana o Juventus é o nosso time, o verdadeiro time italiano, é a nossa casa, pois representa dois times da Itália que são rivais e aqui vivem em união dentro de um único clube.” E assim, surgia o folclórico Juventus da Rua Javari.

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Fora dos bairros tradicionalmente italianos, um prédio que chama a atenção é Edifício Itália – cujo nome oficial é Circolo Italiano – localizado na Avenida Ipiranga. É o segundo maior edifício de São Paulo, e é um dos maiores exemplos da arquitetura vertical brasileira.

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A concepção do edifício foi feita pela colônia italiana de São Paulo, uma vez que a sede do Circolo Italiano, associação de italianos centenária, era no terreno no qual o prédio seria construído. O simbolismo do caráter vertical do Edifício Itália é a ascensão econômica e social dos imigrantes italianos, que foram de trabalhadores agrícolas para influências no seio da cultura paulistana.

O prédio conta com um restaurante no seu terraço, que dispõe de uma vista privilegiada da topografia urbana de São Paulo. No andar térreo, há ainda um teatro e galeria de arte. Inaugurado em 1965, o Edifício Itália é um dos marcos da cidade e do processo de urbanização acelerada, sendo um dos grandes projetos arquitetônicos ao lado do vizinho Copan, o Parque do Ibirapuera e o MASP. A herança italiana, mais do que em construções, respira na cultura, na fala e nos costumes do paulistano. Sem a influência desse povo, parte do que faz São Paulo esse caldeirão de culturas se perderia e a maior cidade do país não seria tão rica quanto é.

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17 respostas

  1. Parabéns pelo impecável texto! Douglas, logo logo e infelizmente, o Shopping Capital situado na Av. Paes de Barros, aproximadamente nº 2000 tb. entrará para esta lista pois há anos-luz está às moscas, já houve invasões, especulações de outros shoopings centers mas ainda nada ficou definido….Tudo por causa da teimosia do proprietário que se recusou a demolir a metragem a mais que a Prefeitura exigiu, pois não constava da planta original de quando havia sido homologada!

    1. E isso sem contar que quando esse prédio estava sendo construído, eu estudava na Unicapital (hoje Uniesp) e só eu e quem se formou na turma de 2005 sabem o quanto que os donos dessa universidade não arrancaram de dinheiro dos alunos para construir esse prédio, se pagava até para respirar dentro da universidade e o pior é que os donos não ofereciam nada em troca, nem mesmo o que deveriam oferecer, eu vi esse prédio do Shopping Capital ser erguido tijolo a tijolo no tempo em que estudei lá e todo ano tinha aumento de mensalidade, na época eu entrei pagando R$ 462,00 por mês e no último ano já estava pagando R$ 750,00 por mês. Na verdade, pelo que eu fiquei sabendo aquele prédio era pra ser somente mais uma unidade da Unicapital e no final os donos acabaram construindo o shopping ali, infringindo a lei, inauguraram na época o shopping com a faca no pescoço pois os lojistas de lá estavam pressionando os caras pelo atraso da obra e então abriram o shopping de qualquer jeito, na única vez em que entrei lá dentro tinha massa corrida nas escadas rolantes e a mesma dava choque na gente, ou seja, os caras já começaram errado, ainda conseguiram por um tempo manter o shopping aberto por meio de liminar, mas ai o “Seu Kassaba” na época em que era prefeito cassou a liminar deles e o resto da história é só passar em frente ao mesmo hoje para saber o fim, investiram o dinheiro dos estudantes daquela época nessa barca furada.

  2. Embora tenha um poderio econômico inegável, São Paulo perde para o Rio como sede de eventos esportivos de vulto. Copa da Confederações, Pan-americano, final da copa-2014 e olimpíadas são exemplos.

    São Paulo ficou apenas com a Formula 1.

    Acho que ainda falta a SP ocupar seu lugar de líderança.

    1. O Rio de Janeiro é a mais famosa cidade do país por motivos históricos. Para um sem número de estrangeiros, o Rio é o Brasil. Futebol, Carmem Miranda, Maracanã, Praias e Mulatas é tudo o que temos. No fundo eles sabem que isso não é verdade, mas preferem não pensar muito.

  3. Este post me lembrou de que já fui ao Edifício Itália, uns 16 anos atrás. Era o ano de vestibular e éramos incentivados a assistir a apresentações teatrais dos livros de leitura obrigatória. Vi no teatro do Edifício Itália à peça “Dom Casmurro”, adaptada da obra de Machado de Assis.

    Por falar em livros e em italianos: fui a um sebo recentemente em Osasco (outra cidade bastante marcada pela influência italiana) e na estante de Literatura Nacional havia exemplares e mais exemplares de “Brás, Bexiga e Barra Funda”, de Antonio de Alcântara Machado. Fiquei abismado! Esse é talvez o único livro literário do século XX brasileiro de qualidade acima da média, em que foram registrados usos e costumes da capital sob a influência dos imigrantes no início do século passado, sem lenga-lenga ideológica ou existencialismos pernósticos, e foi rejeitado por inúmeras pessoas (e muitas delas, na certa, ítalo-descendentes). Eu sou ítalo-descendente e seria impensável ter uma coleção de livros sem o mencionado…

    Ao mesmo tempo que constato a degeneração das pessoas que são indiferentes à sua própria raiz, não estou cego para iniciativas como a deste site, que resgata imóveis, locais e marcos desta cidade tão fascinante que é São Paulo. Continuem o trabalho meritório! Vida longa ao “São Paulo Antiga”! Viva l’Itália!

  4. Algo que seria bastante interessante é a herança nordestina na cidade, que por sinal, é muito maior que qualquer outra, seja italiana, espanhóla, japonesa ou caipira do interior, praticamente todos os paulistanos que conheci na minha vida toda tinham parentes que vieram do Nordeste, e nós, como os principais construtores dessa megalópole chamada são paulo, certamente deixamos uma rica herança, e que até hoje é fortalecida!

    1. Em primeiro lugar, São Paulo deve ser escrita com letras maiúsculas, por favor.
      Agora, o seguinte: que história é essa de que os nordestinos são os “construtores de São Paulo”? Quando os nordestinos começaram a vir para cá, São Paulo já era São Paulo. Se não é assim, então por que começaram a deixar suas cidades nordestinas? Por que vieram (e continuam vindo) para cá? Resposta: São Paulo já tinha condições de vida infinitamente superiores aos lugarejos nordestinos. OS NORDESTINOS COMEÇARAM A VIR PARA SÃO PAULO PARA CONSTRUIR A CIDADE? QUAL É A LÓGICA DISSO? PARTINDO DESSE PRINCÍPIO SIMPLISTA, POR QUE ENTÃO NÃO FICARAM EM SUAS CIDADES E ESTADOS NATIVOS?
      Com todo o respeito que o povo nordestino merece( na verdade, qualquer povo), essa ideia de que os nordestinos vieram construir São Paulo é totalmente equivocada e infeliz, de pessoas que não sabem o que estão falando.
      Sou paulistano, descendente de italianos, sim. Minha querida sogra é de Utinga, interior da Bahia. E daí?

      1. Luiz Henrique, sempre houveram nordestinos em São Paulo, inclusive no começo do século passado. Poderiam ser poucos, mas haviam. O fato é que a partir do final dos anos 50 para cá, quando São Paulo pisa fundo no acelerador rumo à urbanização desenfreada puxada pelo crescimento da indústria, principalmente a metal-mecânica, que coincide com épocas de secas apocalíticas no nordeste além de um investimento pesado em infra-estrutura que permitiu aos migrantes virem para cá, é que houve um aumento substancial de nordestinos (incluindo a minha mãe, alagoana). De certa forma, eles ajudaram sim a construir São Paulo, aliás todos os imigrantes e migrantes cada qual à sua época contribuíram para o crescimento da cidade e do estado.

        1. Emerson, se você disser que os nordestinos CONTRIBUÍRAM para o crescimento de São Paulo, isso está certo.
          O meu questionamento, em resposta ao “Claudomar Recifense”, é que este afirma que os nordestinos são “os principais construtores” de São Paulo – com iniciais MAIÚSCULAS, por favor! E isso não é verdade! Parta do princípio de que as construções antigas da cidade, aliás a razão de existir deste site, são de influência européia(seguiam modelos europeus): italianos, franceses, alemães, ingleses, portugueses e por aí, vai. Casas bonitas, com começo, meio e fim.Bem acabadas.
          Em nenhum momento eu afirmei que os nordestinos não contribuíram para o crescimento de nossa cidade. Mas é fato, também, que as regiões periféricas de São Paulo cresceram muito com a migração, e não só nordestina. São casas mal construídas(tortas!), sem reboco, sem acabamento…

          1. Sou descendente de alagoanos por parte de mãe e de italianos por parte de pai, a arquitetura das casas reflete muito da cultura de um país, e casas humildes em geral têm um quê de organização, porque mesmo as pessoas mais simples gostam de ambientes limpos e arejados. Nem toda casa simples é uma maloca.

  5. Eu não disse que toda casa simples é sinônimo de maloca. Disse? A minha, por exemplo, na periferia de Guarulhos, é muito simples. E põe simples nisso! Mas tem começo, meio e fim. E eu mesmo a pinto, uma vez por ano. Faço questão. E não se enquadra numa “maloca”, para citar um termo que VOCÊ USOU. Pelo menos, pra mim.
    Existem centenas de casas humildes com começo, meio e fim. Terminadas, pintadas, etc.
    As regiões periféricas de São Paulo cresceram e continuam crescendo assustadoramente. E, infelizmente, são muitos(MUITOS MESMO!!) terrenos invadidos, casas sem acabamento(sem reboco), sem um desenho lógico- levantam-se as paredes e faz-se um teto de qualquer jeito, sem quê nem pra quê…Isso sem falar nas ligações clandestinas de água, de luz e de esgoto.

    1. Nossa, como você foi infeliz em todos os seus comentários Luiz Henrique. Muitas das pessoas que moram em casa sem “começo, meio e fim” o fazem por não terem condições de estruturar suas casas da maneira correta ou bem dizendo “segura”. São pessoas que precisam de um lugar pra morar e não pensam em conforto ou beleza e sim em ter um teto sobre suas cabeças. Visão simplista e preconceituosa. Se for usar da sua lógica de “POR QUE ENTÃO NÃO FICARAM EM SUAS CIDADES E ESTADOS NATIVOS?”, porquê seus queridos antepassados italianos não ficaram em seu próprio país?

  6. Eu moro no interior de SP, mas toda as vezes que vou à capital, necessito visitar todos os pontos possíveis, apesar de alguns lugares estarem abandonados, me sinto nostálgica, de alguma forma, essa cidade faz isso comigo…

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